Conflito no Centro Histórico: Denúncia e Decisão do IPHAN Realocam Barraca Tradicional

Barraca tradicional é realocada de lugar no Centro Histórico por decisão do IPHAN, que apontou danos à ambiência tombada. Prefeitura de Porto Seguro, agora sob pressão, promete requalificação com quiosques fixos e negociação com comerciantes até a liberação da área pelo Exército e Marinha

A decisão de realocar uma tradicional barraca de acarajé no Centro Histórico de Porto Seguro gerou tensão entre autoridades, comerciantes e moradores. A medida, respaldada pelo Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (IPHAN), levou à remoção da estrutura instalada entre monumentos coloniais tombados, causando comoção entre frequentadores do local e polêmica na comunidade. A Prefeitura afirma que a decisão visa reordenar o espaço com projetos futuros, enquanto o IPHAN aponta impactos ao conjunto arquitetônico histórico. Mas o que está por trás dessa mudança vai além da simples proteção ao patrimônio.

Denúncia e conflito de interesses

A origem do conflito começou com uma denúncia feita por um comerciante da região, incomodado com a localização da barraca, realocada em 2023 para um ponto mais movimentado entre a Igreja Nossa Senhora da Pena e a antiga Casa de Câmara e Cadeia. Curiosamente, quando a barraca estava localizada em frente à sua loja, ele próprio se beneficiava do fluxo turístico gerado, vendendo sucos em parceria com outra baiana e aproveitando o movimento fomentado por operadoras como Trend, CVC e Azul Viagens.

Com a mudança de ponto, o comerciante teria perdido parte de seu público, e decidiu denunciar a estrutura. A situação evoluiu rapidamente, e a Secretaria de Concessões de Porto Seguro, surpreendentemente, acatou a reclamação como “sustentável”, o que gerou questionamentos por parte da comerciante atingida e apoiadores.

Decisão técnica ou resposta política?

Segundo nota recebida pela redação, a Prefeitura de Porto Seguro informou que a realocação está sendo feita a pedido do IPHAN, por se tratar de uma área de alto valor histórico e turístico. A barraca, segundo o IPHAN, estaria instalada de forma indevida entre três monumentos coloniais, comprometendo a visibilidade e a ambiência da área mais visitada da Cidade Histórica. No entanto, a própria nota do IPHAN afirma que a instalação anterior da barraca foi feita sem diálogo prévio entre o município e o órgão federal, colocando parte da responsabilidade sobre a gestão municipal.

Ainda segundo a Prefeitura, uma solução definitiva está sendo elaborada: um projeto de requalificação urbanística, com apoio técnico do IPHAN, que prevê a instalação de quiosques fixos nas proximidades do Farol, aguardando apenas a autorização da Marinha do Brasil.

Memória, resistência e ausência de diálogo

O ofício das baianas de acarajé é reconhecido como patrimônio imaterial pelo IPHAN, e a presença dessas figuras tradicionais nas ruas brasileiras carrega não apenas significado cultural e religioso, mas também social e econômico. Ainda assim, a remoção repentina sem consulta prévia gerou indignação. Segundo relatos, a proprietária da barraca em questão trabalha há mais de 20 anos no Centro Histórico — não exatamente no ponto atual, mas em áreas próximas — mantendo viva uma tradição que hoje é objeto de políticas públicas de salvaguarda.

Com a nova decisão, a barraca foi realocada provisoriamente para a frente da Igreja da Misericórdia, ponto considerado de menor impacto visual. A mudança foi acordada em uma reunião realizada no Escritório Técnico do IPHAN no último dia 9 de junho, com representantes da Prefeitura e da Secretaria de Concessões.

IPHAN defende decisão e apresenta nota completa

Abaixo, a nota oficial encaminhada pelo IPHAN à redação:

Informamos que a Cidade Histórica de Porto Seguro constitui área de especial interesse de preservação dentro do conjunto tombado pelo IPHAN, por fazer parte do processo inicial de formação da cidade de Porto Seguro, possuindo diversos monumentos do período colonial preservados, além de seu traçado e casario original.

O local possui alguns comerciantes informais, que não possuem autorização para a montagem de suas barracas e exploração da atividade. Muitas vezes, as estruturas provisórias causam impactos negativos consideráveis ao conjunto tombado, a depender de sua localização.

A Prefeitura Municipal de Porto Seguro está elaborando um projeto de requalificação urbanística da Cidade Histórica, com o apoio técnico do IPHAN, que preverá locais mais adequados para a realocação dos comerciantes. A princípio, pretende-se construir quiosques fixos nas proximidades do Farol, cuja autorização da Marinha do Brasil ainda está pendente.

Quanto à barraca de acarajé da Sra., a Secretaria Municipal de Porto Seguro havia estabelecido sua localização entre a Igreja Nossa Senhora da Pena e a Casa de Câmara e Cadeia, sem diálogo prévio com o IPHAN.

Contudo, consideramos que tal área é inapropriada para a permanência da barraca, tendo em vista que esta estava promovendo danos à ambiência e visibilidade do conjunto arquitetônico e paisagístico tombado, sendo que o local é o principal “cartão postal” do Centro Histórico.

Em reunião realizada em 09/06/2025 no Escritório Técnico do IPHAN, da qual participaram diversos representantes da Prefeitura de Porto Seguro, cuja pauta foi exatamente o andamento do projeto da Cidade Histórica, o IPHAN manifestou sobre a necessidade de deslocamento imediato da barraca em questão para outro local, até a execução do projeto com a localização definitiva dos comerciantes.

Após diálogo entre a Sra., o IPHAN e a Secretaria de Concessões, foi definido que a barraca voltará, provisoriamente, para a área em frente à Igreja da Misericórdia, considerando que terá menos impacto neste local.

O ofício das baianas de acarajé é um bem registrado pelo IPHAN como patrimônio imaterial, sendo que este Instituto preza pela sua valorização, sempre em sintonia com a preservação do patrimônio material.”

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